segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Primeiras Pregações

Em 1940, na cidade de Pedro Leopoldo, Minas Gerais, o Espírito Humberto de Campos, através da psicografia de Francisco Cândido Xavier, informou que nas dimensões vibratórias espirituais mais próximas da densidade terrena existem inúmeras escolas de aprendizado, e nelas aprende-se muito com os feitos abençoados, mas que são desconhecidos do registro histórico da humanidade na dimensão física. Na época de Jesus muito outros episódios ocorreram e não foram registrados na Bíblia. Para justificar a sua narrativa, ele cita dois trechos do evangelho que são: Marcos 4 (33) - “Anunciava-lhes a Palavra por meio de muitas parábolas como essas, conforme podiam entender; (34) e nada lhes falava a não ser em parábolas. A seus discípulos, porém, explicava tudo em particular.” ; João 21 (25) - “Há, porém, muitas outras coisas que Jesus fez. Se fossem escritas uma por uma, creio que o mundo não poderia conter os livros que se escreveriam.” (Bíblia de Jerusalém)
     Com a narrativa  de Humberto de Campos podemos compreender, de uma forma mais ampla,  o desejo de Jesus e a dificuldade de compreensão dos seus discípulos e religiosos em relação a sua obra.
     Era de costume os Judeus fazerem peregrinações para Jerusalém para visitarem o Templo de Salomão, e os galileus eram reconhecidos pelo seu modo de se vestirem e seus cabelos compridos.      No diálogo com o Sacerdote Hanã podemos perceber o “orgulho intelectual” que apresentam todos aqueles que se submetem a um condicionamento religioso, sem desenvolverem uma compreensão e aceitação de outras maneiras de pensar.
     No momento do convite que Jesus fez a Simão e a André percebemos a simplicidade dos dois pescadores, sem muito entendimento quanto a proposta inicial de Jesus em relação à construção do Reino de Deus na Terra. Pelo diálogo demonstraram compreender que este  Reino seria na parte material,  com governantes e súditos, iguais aos que existiam na Terra. Com o passar do tempo é que foram entendendo que Jesus desejava construir o Reino dos Céus no coração dos seres humanos. A Boa Nova (Boa Notícia) que Jesus Trazia era a de uma doutrina consoladora endereçada a todos que com o coração puro e sincero aceitassem novos esclarecimentos, quanto à compreensão da vontade de Deus e o comportamento ideal para se ajustar às Suas Leis. O Reino de Deus no coração significa mudança no pensamento e no sentimento vivenciando-os através dos atos de verdadeira fraternidade. Jesus iniciou a sua doutrina consoladora e ela atravessou os milênios servindo como guia do nosso comportamento, para que pudéssemos compreender melhor o nosso processo evolutivo.
      Portanto, para a nossa evolução torna-se necessário vigiar nosso “orgulho intelectual” adquirido através das doutrinas religiosas; percebendo-se que o Reino de Deus é revelado de forma gradativa conforme nossa maturidade espiritual.
V.Lau


Mateus 4
Retorno à Galileia12 Ao ouvir que João havia sido preso, ele voltou para a Galileia 13 e, deixando Nazara, foi morar em Cafarnaum, à beira-mar, nos confins de Zabulon e Neftali, 14 para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta Isaías: (Mc 1, 14-15 – Lc 4,14 – Jo 4, 1-3. 43-45 e 13, 53s)
15 Terra de Zabulon, terra de Neftali,
Caminho do mar, região além do Jordão,
Galileia das nações! (Is 8, 23 – 9,1  1Mc 5,15  Jo 7,52)
16 O povo que jazia nas trevas
Viu uma grande luz;
Aos que jaziam na região sombria da morte,
Surgiu uma luz.  (Lc 1,79s   Jo 8,12 + Rm 2,19)
17 A partir desse momento, começou Jesus a pregar e a dizer: “Arrependei-vos, porque está próximo o Reino dos Céus” (3,2 + Dn 7,14)

Chamado dos quatro primeiros discípulos18 Estando ele a caminhar junto ao mar da Galileia, viu dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André, que lançavam a rede ao mar, pois eram pescadores. 19 Disse-lhes: “Segui-me, e eu farei de vós pescadores de homens”. 20 Eles, deixando imediatamente as redes, o seguiram. (Mc 1,16-20  Lc 5, 1-11   Jo 1,35-42)

BÍBLIA DE JERUSALÉM – Nova edição, revista e ampliada. Tradução do texto em língua portuguesa diretamente dos originais. PAULUS – 2002 -  São Paulo.
 Mateus 4
Jesus volta para a Galileia (Mc 1.14-15; Lc4.14-15)
12 Ouvindo, porém, Jesus que João fora preso, retirou-se para a Galileia;
13 e, deixando Nazaré, foi morar em Cafarnaum, situada à beira-mar,  nos confins de Zebulom e Naftali;
14 para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías:
15 Terra de Zebulom, terra de Naftali, caminho do mar, além do Jordão, Galiléia dos gentios!
16 O povo que jazia em trevas viu grande luz, e aos que viviam na região e sombra da morte resplandeceu-lhes a luz.
17 Daí por diante, passou Jesus a pregar e a dizer: Arrempendei-vos, porque está próximo o reino dos céus.
A vocação de discípulos (Mc 1.16-20; Lc 5.1-11)
18 Caminhando junto ao mar da Galiléia, viu dois irmão, Simão, chamado Pedro, e André, que lançavam as redes ao mar, porque eram pescadores.
19 E disse-lhes: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens.
20 Então, eles deixaram imediatamente as redes e o seguiram.

BÍBLIA SAGRADA – Antigo e Novo Testamento – Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada no Brasil. 2 ed. Barueri –SP: Sociedade Biblica do Brasil, 2008.


Pedro  Leopoldo (MG), novembro de 1940

Espírito Humberto de Campos

PRIMEIRAS PREGAÇÕES
     Nos primeiros dias do ano 30, antes de suas gloriosas manifestações, avistou-se Jesus com o Batista, no deserto triste da Judeia, não muito longe das areias ardentes da Arábia. Ambos estiveram juntos, por alguns dias, em plena natureza, no campo ríspido do jejum e da penitência do grande precursor, até que o Mestre divino, despedindo-se do companheiro, demandou o oásis de Jericó, uma bênção de verdura e água, entre as inclemências da estrada agreste. De Jericó dirigiu-se então a Jerusalém, onde repousou, ao cair da noite.
    Sentado como um peregrino, nas adjacências do templo, Jesus foi notado por um grupo de sacerdotes e pensadores ociosos, que se sentiram atraídos pelos seus traços de formosa originalidade e pelo seu olhar lúcido e profundo. Alguns deles se afastaram, sem maior interesse, mas Hanã, que seria, mais tarde, o juiz inclemente de sua causa, aproximou-se do desconhecido e dirigiu-se lhe com o orgulho:
     - Galileu, que fazes na cidade?
     - Passo por Jerusalém, buscando a fundação do Reino de Deus – exclamou o Cristo, com modesta nobreza.
     - Reino de Deus? – tornou o sacerdote com acentuada ironia. – E que pensas tu venha a ser isso?
     - Esse Reino é a obra divina no coração dos homens! – esclareceu Jesus, com grande serenidade.
     - Obra divina em tuas mãos? – revidou Hanã, com uma gargalhada de desprezo.
     E, continuando as suas observações irônicas, perguntou: Quais são os teus seguidores e companheiros? ... Acaso terás conquistado o apoio de algum príncipe desconhecido e ilustre, para auxiliar-te na execução de teus planos?
     Meus companheiros hão de chegar de todos os lugares – respondeu o Mestre com humildade.
    - Sim – observou Hanã -, os ignorantes e os tolos estão em tua edificação. Entretanto, propões-te realizar uma obra divina e já viste alguma estátua perfeita modelada em fragmentos de lama?
    - Sacerdote – replicou-lhe Jesus, com energia serena -, nenhum mármore existe mais puro e mais formoso do que o do sentimento, e nenhum cinzel é superior ao da boa vontade sincera.
     Impressionado com a resposta firme e inteligente, o famoso juiz ainda interrogou:
    - Conheces Roma ou Atenas?
    - Conheço o Amor e a Verdade – disse Jesus convictamente.
    - Tens ciência dos códigos da Corte Provincial e das leis do Templo? – inquiriu Hanã, inquieto.
    - Sei qual é a vontade de meu Pai que está nos céus – respondeu o Mestre, brandamente.
    O sacerdote o contemplou irritado e, dirigindo-lhe um sorriso de profundo desprezo, demandou a Torre Antônia, em atitude de orgulhosa superioridade.
     No dia seguinte, pela manhã, o mesmo formoso peregrino foi ainda visto a contemplar as maravilhas do santuário, antes alguns minutos de internar-se pelas estradas banhadas de sol, a caminho de sua Galileia distante.


     Daí a algum tempo, depois de haver passado por Nazaré, descansando igualmente em Canã, Jesus se encontrava nas circunvizinhanças da cidadezinha de Cafarnaum, como se procurasse, com viva atenção, algum amigo que estivesse à sua espera.
    Em breves instantes, ganhou as margens do Tiberíades e se dirigiu, resolutamente, a um grupo alegre de pescadores, como se, de antemão, os conhecesse a todos.
     A manhã era bela, no seu manto diáfano de radiosas neblinas. As águas transparentes vinham beijar os eloendros da praia, com se brincassem ao sopro das virações perfumadas da Natureza. Os pescadores entoavam uma cantiga rude e, dispondo inteligentemente as barcaças móveis, deitavam as redes, em meio a profunda alegria.
     Jesus aproximou-se do grupo e, assim que dois deles desembarcaram em terra, falou-lhes com amizade:
     - Simão e André, filhos de Jonas, venho da parte de Deus e vos convido a trabalhar pela instituição de seu Reino na Terra!
     André lembrava-se de já o ter visto, nas cercanias de Betsaida,  e do que lhe haviam dito a seu respeito, enquanto Simão, embora agradavelmente surpreendido, o contemplava enleado. No entanto, quase a um só tempo, dando expansão aos seus temperamentos acolhedores e sinceros, exclamaram respeitosamente:
    - Sede bem-vindo!...
    Jesus então lhes falou docemente do Evangelho, com o olhar incendido de júbilos divinos.
    Estando muitos outros companheiros do lago a observar de longe os três, André, manifestando a sua tocante ingenuidade, exclamou comovido:
     - Um rei? Mas em Cafarnaum existem tão poucas casas!...
    Ao que Pedro obtemperou, como se a boa vontade devesse suprir todas as deficiências:
    - O lago é muito grande e há várias aldeias circundando estas águas. O Reino poderá abrange-las todas!
    Isso dizendo, fixou em Jesus o olhar perquiridor, como se fora uma grande criança meiga e sincera, desejosa de demonstrar compreensão e bondade. O Senhor esboçou um sorriso sereno e, como se adiasse com prazer as suas explicações para mais tarde, inquiriu generosamente:
    - Quereis ser meus discípulos?
    André e Simão se interrogaram a si mesmos, permutando sentimentos de admiração embevecida. Refletia Pedro: que homem seria aquele? Onde já lhe escutara o timbre carinhoso da voz íntima e familiar? Ambos os pescadores se esforçavam por dilatar o domínio de suas lembranças, de modo a encontra-lo nas recordações mais queridas. Não sabiam, porém, como explicar aquela fonte de confiança e de amor que lhes brotava no âmago do espírito e, sem hesitarem, sem uma sombra de dúvida, responderam simultaneamente:
     - Senhor, seguiremos os teus passos.
     Jesus os abraçou com imensa ternura e, como os demais companheiros se mostrassem admirados e trocassem entre si ditérios ridicularizadores, o Mestre, acompanhado de ambos e de grande grupo de curiosos, se encaminhou para o centro de Cafarnaum, na qual se erguia a Intendência de Ântipas. Entrou calmamente na coletoria e, avistando um funcionário culto, conhecido publicano da cidade, perguntou-lhe:
    - Que fazes tu, Levi?
    O interpelado fixou-o com surpresa; mas, seduzido pelo suave magnetismo de seu olhar, respondeu sem demora:
    - Recolho os impostos do povo, devidos a Herodes.
    - Queres vir comigo para recolher os bens do Céu? – perguntou-lhe Jesus, com firmeza e doçura.
    Levi, que seria mais tarde o apóstolo Mateus, sem que pudesse definir as santas emoções que lhe dominaram a alma, atendeu, comovido:
     - Senhor, estou pronto!...
     -Então, vamos- disse Jesus, abraçando-o.
     Em seguida, o numeroso grupo se dirigiu para a casa de Simão Pedro, que oferecera ao Messias acolhida sincera em sua residência humilde, onde o Cristo fez a primeira exposição de sua consoladora doutrina, esclarecendo que a adesão desejada era a do coração sincero e puro, para sempre, às claridades do seu Reino. Iniciou-se naquele instante a eterna união dos inseparáveis companheiros.


     Na tarde desse mesmo dia, o Mestre fez a primeira pregação da Boa Nova na praça ampla, cercada de verdura e situada naturalmente junto às águas.
     No céu, vibravam harmonias vespertinas, como se a tarde possuísse também uma alma sensível. As árvores vizinhas acenavam os ramos verdes ao vento do crepúsculo, com mãos da Natureza que convidassem os homens à celebração daquele primeiro ágape. As aves ariscas pousavam de leve nas alcaparreiras mais próximas, como se também desejassem senti-lo, e na praia extensa se acotovelava a grande multidão de pescadores rústicos, de mulheres aflitas por continuadas flagelações, de crianças sujas e abandonadas, misturados publicanos pecadores com homens analfabetos e simples, que haviam acorrido, ansiosos por ouvi-lo.
    Jesus contemplou a multidão e enviou-lhe um sorriso de satisfação. Contrariamente às ironias de Hanã, Ele aproveitaria o sentimento como mármore precioso e a boa vontade como cinzel divino. Os ignorantes do mundo, os fracos, os sofredores, os desalentados, os doentes e os pecadores seriam em suas mãos o material de base para a sua construção eterna e sublime. Converteria toda a miséria e toda dor num cântico de alegria e, tomado pelas inspirações sagradas de Deus, começou a falar da maravilhosa beleza do seu Reino. Magnetizado pelo seu amor, o povo o escutava num grande transporte de ventura. No céu havia uma vibração de claridade desconhecida.
     Ao longe, no firmamento de Cafarnaum, o horizonte se tornara um deslumbramento de luz e, bem no alto, na cúpula dourada e silenciosa, as nuvens delicadas e alvas tomavam a forma suave das flores e dos arcanjos do Paraíso.
Boa Nova” – pelo Espírito Humberto de Campos – psicografado por Francisco Cândido Xavier –FEB 2013.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Sociedade Judaica na Época de Jesus

     
     
Fonte: Bíblia de Jerusalém
C
omo podemos ver no mapa, há dois mil anos atrás, no tempo de Jesus, a Palestina era uma região dividida entre a Judéia, Samaria, Peréia, Galiléia, Decápolis, Fenícia e Síria. Os textos transcritos abaixo revelam que na época em que Jesus viveu na Galileia , Samaria e Judéia estas regiões eram dominadas pelo Império Romano que cobravam impostos de todas elas. Esta prática desagradava aos judeus que se revoltavam e tratavam a questão como sendo contrária a religião que professavam. Mas, Por outro lado, a classe sacerdotal se enriquecia através das moedas adquiridas em nome de Deus. Dentro do Judaísmo havia diversas seitas derivadas que adotavam interpretações próprias das escrituras sagradas,  criando seus dogmas  e rituais diferentes. Neste ambiente Jesus nasceu, cresceu e iniciou a sua jornada sublime da construção do reino de Deus nos corações dos homens. As várias seitas do judaísmo tinham um ponto em comum, que era a crença em um único Deus; esta crença foi iniciada com o trabalho missionário de Abrão e foi solidificada através de Moisés. Estes e outros missionários vieram executar um trabalho que  teve sua origem no mundo espiritual; eles vieram preparar o caminho para a vinda do sublime peregrino, Jesus. Se Jesus encontrou incompreensão durante a pregação da “Boa Nova” no seio de uma religião monoteísta, a dificuldade seria ainda maior se fosse no meio de seitas com crenças em vários deuses. Os judeus, segundo as profecias , aguardavam a vinda de um Messias, e esperavam que ele fosse surgir dentro da classe dos sacerdotes. Segundo a crença deles, este Messias nasceria em Jerusalém e estabeleceria um reino e a supremacia religiosa em todas as regiões, inclusive libertando-os do domínio romano. Jesus, apesar de ter nascido em Belém, na Judéia, vivia em Nazaré, na Galileia, e os religiosos da época não esperavam que fosse nascer ali o Messias.  O orgulho dos “doutores” da lei religiosa condenou Jesus por ele abalar as estruturas canônicas cristalizadas   da época, quanto a uma compreensão maior da Vontade divina.
     Portanto, para não termos uma fé superficial presa tão somente na “forma” das escrituras sagradas, é necessário buscarmos a essência dos ensinos, a sua convergência e não desprezarmos o contexto histórico da época em que foram elaborados. É preciso cuidar, também, para não nos transformarmos em novos “doutores das leis”, ficando estagnados. Devemos procurar sempre enxergar que as revelações vindas da dimensão espiritual são gradativas e Deus as envia conforme nossa maturidade espiritual.
V. Lau



 Paris (FR), abril de 1864.

Allan Kardec

     Para bem compreender certas passagens dos Evangelhos, é necessário conhecer o valor de várias palavras que nele são empregadas com frequência, e que caracterizam o estado dos costumes e da sociedade judaica dessa época. Essas palavras, não tendo para nós o mesmo sentido, frequentemente foram mal interpretadas, e por isso  mesmo deixaram uma espécie de incerteza. A compreensão do seu significado explica, por outro lado, o sentido verdadeiro de certas máximas que parecem estranhas à primeira vista.
    
    SAMARITANOS. Depois do cisma das dez tribos, Samaria tornou-se a capital do reino dissidente de Israel. Destruída e reconstruída por várias vezes, ela foi, sob os Romanos, a sede da Samaria, uma das quatro divisões da Palestina. Herodes, dito o Grande, a embelezou, com suntuosos monumentos, e, para agradar Augusto, deu-lhe o nome de Augusta em grego Sébaste.

     Os Samaritanos estiveram, quase sempre, em guerra com os reis de Judá; uma aversão profunda, datando da separação, perpetuou-se entre os dois povos, que afastavam todas as relações recíprocas. Os Samaritanos, para tornar a cisão mais profunda e não ter que ir a Jerusalém na celebração das festas religiosas, construíram um templo particular, e adotaram certas reformas. Eles não admitiam senão o Pentateuco contendo a lei de Moisés, rejeitando todos os livros que lhe foram anexados depois. Seus livros sagrados eram escritos em caracteres hebreus da mais alta antiguidade. Aos olhos dos Judeus ortodoxos, eles eram heréticos, e, por isso mesmo, desprezados, anatematizados e perseguidos. O antagonismo das duas nações tinha, pois, por único principio a divergência das opiniões religiosas, embora suas crenças tivessem a mesma origem; eram os Protestantes daquela época.

     Encontram-se, ainda hoje, Samaritanos em algumas regiões do Levante, particularmente em Naplouse e Jaffa. Eles observam a lei de Moisés com mais rigor que os outros Judeus, e não contraem aliança senão entre eles.
    
     NAZARENOS. Nome dado, na antiga lei, aos Judeus que faziam voto, seja pela vida, seja por um tempo, de conservar uma pureza perfeita. Eles se obrigavam à castidade, à abstinência de álcool e à conservação da sua cabeleira. Sansão, Samuel e João Batista eram Nazarenos.
     Mais tarde, os Judeus deram esse nome aos primeiros cristãos, por alusão a Jesus de Nazaré.
     Este foi também o nome de uma seita herética dos primeiros séculos da era cristã  que, da mesma forma que os Ebionitas, dos quais ela adotava certos princípios, misturava as práticas do Mosaísmo com os dogmas cristãos. Essa seita desapareceu no quarto século.

     PUBLICANOS. Assim se chamavam, na antiga Roma, os cavaleiros arrematantes das taxas públicas, encarregados do recolhimento dos impostos e das rendas de toda natureza, seja na própria Roma, seja em outras partes do Império. Eles eram análogos aos arrematantes de impostos gerais do antigo regime na França, e tais como existem ainda em certas regiões. Os riscos que eles corriam faziam fechar os olhos sobre as riquezas que, frequentemente, adquiriam, e que, em muitos, eram o produto de exações e de benefícios escandalosos. O nome de publicano se estendeu mais tarde a todos aqueles que tinham a administração do dinheiro público e aos agentes subalternos. Hoje, esta palavra se toma em mau sentido para designar os financistas e agentes de negócios pouco escrupulosos; diz-se algumas vezes: “Ávido como um publicano; rico como um publicano”, para uma fortuna de origem desonesta.

    Da denominação romana, foi o imposto o que os judeus aceitaram mais dificilmente e o que lhes causava maior irritação, dando origem a várias revoltas e transformando-se numa questão religiosa, porque o olhavam como contrário à lei. Formou-se mesmo um partido poderoso à frente do qual estava um certo Judas, dito o Gaulonita, que tinha por princípio a recusa do imposto. Os Judeus tinham, pois horror ao imposto e, por consequência, a todos aqueles que estavam encarregados de recebê-lo; daí sua aversão pelos publicanos de todas as categorias, entre os quais poderiam se encontrar pessoas muito estimáveis, mas que, devido à sua função, eram desprezadas, assim como aqueles que com eles conviviam, e que eram confundidos na mesma reprovação. Os Judeus mais importantes acreditavam comprometer-se tendo com eles relações de intimidade.

     OS PORTAGEIROS. Eram os cobradores de baixa categoria, encarregados principalmente da arrecadação dos direitos à entrada nas cidades. Suas funções correspondiam aproximadamente às dos guardas alfandegários e dos recebedores de barreira; eles sofriam a mesma reprovação aplicada aos publicanos em geral. É por essa razão que, no Evangelho, encontra-se, frequentemente, o nome de publicano unido ao de gente de má vida; essa qualificação não implicava na de debochados e de pessoas de honra duvidosa; era um termo de desprezo, sinônimo de pessoas de má companhia, indignas de conviverem com pessoas de bem.

     FARISEUS (do Hebreu Parash, divisão, separação). A tradição formava uma parte importante da teologia judaica; ela consistia na coletânea das interpretações sucessivas dadas sobre o sentido das Escrituras, e que se tornavam artigos de dogma. Era, entre os doutores, objeto de intermináveis discussões, o mais frequentemente sobre simples questões de palavras ou de forma, no gênero das disputas teológicas e das sutilezas da escolástica da Idade Média; daí nascerem diferentes seitas que pretendiam ter, cada uma, o monopólio da verdade, e, como acontece quase sempre, detestando-se cordialmente umas às outras.

     Entre essas seitas, a mais influente era a dos Fariseus, que teve por chefe Hillei, doutor, judeu nascido na Babilônia, fundador de uma escola célebre onde se ensinava que a fé não era devida senão às Escrituras. Sua origem remonta aos anos 180 ou 200 antes de Jesus Cristo. Os Fariseus foram perseguidos em diversas épocas, notadamente sob Hircânio, soberano pontífice e rei dos Judeus, Aristóbulo e Alexandre, rei da Síria; entretanto, este último tendo lhes restituído suas honras e seus bens, eles recuperaram seu poder que conservaram até a ruína de Jerusalém, no ano 70 da era cristã, época na qual seu nome desapareceu em consequência da dispersão dos Judeus.

     Os Fariseus tomavam parte ativa nas controvérsias religiosas. Servis observadores das práticas exteriores do culto e das cerimônias, cheios de um zelo ardente de proselitismo, inimigos dos inovadores, eles afetavam uma grande severidade de princípios; mas, sob as aparências de uma devoção meticulosa, escondiam costumes dissolutos, muito orgulho, e, acima de tudo, uma paixão excessiva de dominação. A religião era, para eles, antes um meio de subir do que o objeto de uma fé sincera. Eles não tinham senão as aparências e a ostentação da virtude; mas, com isso, exerciam uma grande influência sobre o povo, aos olhos do qual passavam por santos personagens; por isso, eram muito poderosos em Jerusalém.

    Acreditavam, ou pelo menos faziam profissão de crer, na Providência, na imortalidade da alma, na eternidade das penas e na ressurreição dos mortos. (Cap. IV, nº4.) Jesus, que estimava, antes de tudo, a simplicidade e as qualidades de coração, que preferia na lei o espírito que vivifica à letra que mata, se aplicou durante toda a sua missão, a lhes desmascarar a hipocrisia, e, por conseguinte, fez deles inimigos obstinados; por isso, aliaram-se aos príncipes dos sacerdotes para amotinar o povo contra ele e fazê-lo perecer.

     ESCRIBAS. Nome dado, no princípio, aos secretários dos reis de Judá, e a certos intendentes dos exércitos Judeus; mais tarde, esta designação foi aplicada especialmente aos doutores que ensinavam a lei de Moisés e a interpretavam ao povo. Eles faziam causa comum com os Fariseus, dos quais partilhavam os princípios e a antipatia contra os inovadores; por isso, Jesus os confunde na mesma reprovação.

    SINAGOGA (do grego Sunagogue, assembleia, congregação). Não havia na Judéia senão um único templo, o de Salomão, em Jerusalém, onde se celebravam as grandes cerimônias do culto. Os Judeus para aí seguiam todos os anos em peregrinação, para as principais festas, tais como as da Páscoa, da Dedicação e dos Tabernáculos. Foi nessas ocasiões que, para lá, Jesus fez várias viagens. As outras cidades não tinham templos, mas sinagogas, edifícios onde os Judeus se reuniam aos sábados para fazer preces públicas, sob a direção dos Anciãos, dos escribas ou doutores da lei; faziam-se aí, também, leituras tiradas dos livros sagrados que eram explicadas e comentadas; cada um podia nelas tomar parte e, por isso, Jesus, sem ser sacerdote, ensinava nas sinagogas, nos dias de sábado.

    Depois da ruína de Jerusalém e da dispersão dos Judeus, as sinagogas, nas cidades que eles habitavam, serviam-lhes de templos para a celebração do culto.

     SADUCEUS. Seita judia que se formou por volta do ano 248 AC; assim chamada em razão de Sadoc, seu fundador. Os Saduceus não acreditavam nem na imortalidade da alma, nem na ressurreição, nem nos bons e maus anjos. Entretanto, eles acreditavam em Deus, mas não esperando nada depois da morte, não o servindo senão com o objetivo de recompensas temporais, ao que, segundo eles, se limitava sua providência; também a satisfação dos sentidos era, a seus olhos, o objetivo essencial da vida. Quanto às Escrituras, eles se prendiam ao texto da lei antiga, não admitindo nem a tradição, nem nenhuma interpretação; colocavam as boas obras e a execução pura e simples da lei, acima das práticas exteriores do culto. Eram, como se vê, os materialistas, os deístas e os sensualistas da época. Esta seita era pouco numerosa, mas contava com personalidades importantes, e tornou-se um partido político constantemente em oposição aos Fariseus.

     ESSÊNIOS ou ESSEUS. Seita judia fundada por volta do ano 150 AC., ao tempo dos Macabeus, e cujos membros, que habitavam espécies de monastérios, formavam entre eles uma espécie de associação moral e religiosa. Distinguiam-se pelos costumes brandos e virtudes austeras, ensinavam o amor a Deus e ao próximo, a imortalidade da alma, e acreditavam na ressurreição. Viviam no celibato, condenavam a servidão e a guerra, tinham seus bens em comum, e se entregavam à agricultura. Em oposição aos Saduceus sensuais que negavam a imortalidade, aos Fariseus rígidos para as práticas exteriores, e nos quais a virtude não era senão aparente, eles não tomavam nenhuma parte nas querelas que dividiam essas duas seitas. Seu gênero de vida se aproximava ao dos primeiros cristãos, e os princípios de moral que professavam fizeram algumas pessoas pensarem que Jesus fez parte dessa seita antes do início de sua missão pública. O que é certo, é que ele deve tê-la conhecido, mas nada prova que a ela se filiou, e tudo o que se escreveu a este respeito é hipotético.

     TERAPEUTAS (do grego Thérapeutai, servir, cuidar; quer dizer, servidores de Deus ou curandeiros). Sectários judeus contemporâneos do Cristo, estabelecidos principalmente em Alexandria, no Egito. Tinham uma grande semelhança com os Essênios, dos quais professavam os princípios; como este últimos, ele se entregavam à pratica de todas as virtudes. Sua alimentação era de uma extrema frugalidade; devotados ao celibato, à contemplação e à vida solitária, formavam uma verdadeira ordem religiosa. Fílon, filósofo judeu platônico de Alexandria, foi o primeiro que falou dos Terapeutas; considerou-os uma seita do judaísmo. Eusébio, São Jerônimo e outros Pais da Igreja pensavam que eram cristãos. Fossem judeus ou cristãos, é evidente que da mesma forma que os Essênios, eles formam o traço de união entre o judaísmo e o Cristianismo.
    
Allan Kardec – O Evangelho Segundo o Espiritismo- Tradução de Salvador Gentile, revisão de Elias Barbosa. Araras, SP – IDE, 309ª edição, 2005.