Paris, março de 1858.
|
Allan Kardec |
|
Pluralidade dos Mundos
Quem ainda não se perguntou,
considerando a Lua e os outros astros, se
esses globos são habitados?
Antes que a Ciência nos houvesse
iniciado na natureza desses astros, podia-se duvidar; hoje, no estado atual
de nossos conhecimentos, pelo menos há probabilidade; mas, a essa idéia
verdadeiramente sedutora, são feitas objeções tiradas da própria Ciência.
Parece, dizem, que a Lua não tem
atmosfera e, provavelmente, não tem água. Em Mercúrio, tendo em vista a sua proximidade do Sol, a temperatura
média deve ser a do chumbo fundido, de sorte que, se ali houver este metal,
deve correr como a água dos nossos rios. Em Saturno dá-se exatamente o oposto; não temos um termo de
comparação para o frio que lá deve reinar; a luz do Sol deve ser muito fraca,
apesar do reflexo de suas sete luas e de seu anel, porquanto, àquela
distância, o Sol não deve parecer senão como estrela de primeira grandeza. Em
tais condições, pergunta-se se seria possível viver.
Não se concebe que semelhante objeção
possa ser feita por homens sérios. Se
a atmosfera da Lua não foi percebida, será racional inferir que não exista? Não poderá ser formada de elementos
desconhecidos ou bastante rarefeitos para não produzirem refração sensível?
Diremos a mesma coisa da água ou dos líquidos ali existentes.
Em relação aos seres vivos, não seria
negar o poder divino julgar impossível uma organização diferente da que
conhecemos, quando, sob nossos olhos, a providência da Natureza se estende
com uma solicitude tão admirável até o menor inseto, dando a todos os seres
órgãos apropriados ao meio em que devem viver, seja a água, o ar ou a terra,
estejam imersos na escuridão ou expostos à luz do Sol? Se jamais houvéssemos
visto peixes, não poderíamos conceber seres vivendo na água; não faríamos uma
idéia de sua estrutura. Ainda há pouco tempo, quem teria acreditado que um
animal pudesse viver indefinidamente no seio de uma pedra? Mas, sem falar
desses extremos, os seres que vivem sob o forte calor da zona tórrida
poderiam existir nos gelos polares? E, entretanto, há nesses gelos seres
organizados para esse clima rigoroso, incapazes de suportar a ardência de um
sol tropical. Por que, então, não admitir que os seres possam ser
constituídos de maneira a viver em outros globos e em um meio totalmente
diferente do nosso?
Seguramente, sem conhecer a constituição
física da Lua, dela sabemos o bastante para estarmos certos de que, tais
quais somos, ali não poderíamos viver, como não o podemos no seio do oceano,
na companhia dos peixes. Pela mesma razão, se os habitantes da Lua,
constituídos para viver sem ar ou num ar muito rarefeito, talvez
completamente diverso do nosso, pudessem um dia vir à Terra, seriam
asfixiados em nossa espessa atmosfera, como ocorre conosco quando caímos na
água.
Ainda uma vez, se não temos a prova
material e de visão da presença de seres vivos em outros mundos, nada
prova que não possam existir organismos apropriados a um meio ou a um clima
qualquer. Ao contrário, diz-nos o simples bom-senso que deve ser assim, uma vez que repugna à razão acreditar
que esses inumeráveis globos que circulam no espaço não passem de massas
inertes e improdutivas. A observação, ali, nos mostra superfícies
acidentadas, como aqui, por montanhas, vales, barrancos, vulcões extintos ou
em atividade; por que, então, lá não haveria seres orgânicos? Seja, dirão;
que haja plantas, mesmo animais, é possível; porém, seres humanos, homens
civilizados como nós, conhecendo Deus, cultivando as artes, as ciências, será
possível?
Por certo nada prova matematicamente que
os seres que habitam os outros mundos sejam homens como nós, nem que sejam
mais ou menos avançados do que nós, moralmente falando; mas, quando os
selvagens da América viram desembarcar os espanhóis, não tiveram mais dúvidas
de que, além dos mares, existia um outro mundo, cultivando artes que lhes
eram desconhecidas.
A Terra é salpicada de inumerável
quantidade de ilhas, pequenas ou grandes, e tudo o que é habitável é
habitado; não surge no mar um rochedo sem que o homem ali não plante a sua
bandeira. Que diríamos se os habitantes de uma dessas menores ilhas,
conhecendo perfeitamente a existência das outras ilhas e continentes, mas não
tendo tido jamais relações com os que os habitam, acreditassem ser os únicos
seres vivos do globo? Dir-lhes-íamos: Como podeis acreditar que Deus tenha
feito o mundo somente para vós? Por qual estranha bizarrice vossa pequena
ilha, perdida num canto do oceano, teria o privilégio de ser a única
habitada? Podemos dizer o mesmo em relação às outras esferas. Por que a
Terra, pequeno globo imperceptível na imensidão do Universo, que dos outros
planetas não se distingue nem por sua posição, nem por seu volume, nem por
sua estrutura, visto não ser nem a menor, nem a maior, nem está no centro,
nem na extremidade; por que, dizíamos, dentre tantas outras seria a única
morada de seres racionais e pensantes? Que homem sensato poderia crer que
esses milhões de astros que cintilam sobre nossas cabeças foram feitos
somente para recrear os nossos olhos?
Qual seria, então, a utilidade desses
outros milhões de globos invisíveis a olho nu e que não servem sequer para
nos iluminar? Não haveria ao mesmo tempo orgulho e impiedade pensar que assim
fosse? Àqueles a quem pouco importa a impiedade, diremos que é ilógico.
Chegamos, pois, por um simples raciocínio, que muitos outros fizeram antes
de nós, a concluir pela pluralidade
dos mundos, e esse
raciocínio é confirmado pelas revelações dos Espíritos. Com efeito, eles nos ensinam que todos esses mundos são habitados
por seres corporais apropriados à constituição física de cada globo; que, entre os
habitantes desses mundos, uns são
mais, outros menos adiantados que nós, do ponto de vista intelectual, moral e
mesmo físico. Ainda mais: sabemos hoje que podemos entrar em relação
com eles e obter informações sobre o seu estado; sabemos, igualmente, que não
apenas são habitados todos os globos por seres corpóreos, mas que o espaço é
povoado de seres inteligentes, a nós invisíveis por causa do véu material
lançado sobre nossa alma e que revelam sua existência por meios ocultos ou patentes.
Assim, tudo é povoado no Universo, a vida e a inteligência estão por toda
parte: nos globos sólidos, no ar,
nas entranhas da Terra, e até nas profundezas etéreas. Haverá nessa
doutrina alguma coisa que repugne à razão? Não é, ao mesmo tempo, grandiosa e
sublime? Ela nos eleva por nossa própria pequenez, bem ao contrário desse
pensamento egoísta e mesquinho, que nos coloca como os únicos seres dignos de
ocupar o pensamento de Deus.
(Revista Espírita -
Jornal de estudos Psicológicos – Ano I nº 3- pag.109)
|
Paris (FR), 1864.
|
Allan Kardec |
|
(...) 2. A casa do Pai é o Universo; as diferentes moradas são os mundos que circulam no
espaço infinito, e oferecem, aos Espíritos encarnados, moradas apropriadas ao seu
adiantamento.
Independentemente da diversidade dos
mundos, essas palavras podem também ser entendidas como o estado feliz ou infeliz do Espírito na erraticidade.
Segundo ele seja mais ou menos depurado e desligado dos laços materiais, o
meio em que se encontra, o aspecto das coisas, as sensações que experimenta,
as percepções que possui, variam ao infinito; enquanto que uns não podem se distanciar da esfera em que viveram,
outros se elevam e percorrem o espaço e os mundos; enquanto certos Espíritos
culpados erram nas trevas, os felizes gozam de uma claridade resplandecente e
do sublime espetáculo do infinito; enquanto, enfim, que o mau, atormentado de
remorsos e de lamentações, frequentemente só, sem consolação, separado dos
objetos da sua afeição, geme sob o constrangimento dos sofrimentos morais, o
justo, reunido àqueles que ama, goza as doçuras de uma indizível felicidade.
Lá também há, pois, várias moradas, embora não sejam nem circunscritas nem
localizadas.
DIFERENTES CATEGORIAS DE MUNDOS HABITADOS
3. Do ensinamento dado pelos Espíritos, resulta que os diversos mundos estão
em condições muito diferentes uns dos outros quanto ao grau de adiantamento
ou de inferioridade de seus habitantes. Entre eles há os que seus
habitantes são ainda inferiores aos da Terra, física e moralmente; outros
estão no mesmo grau, e outros lhes são mais ou menos superiores em todos os
aspectos. Nos mundos inferiores, a existência é toda material, as paixões
reinam soberanamente, e a vida moral é quase nula. A medida que esta se desenvolve, a
influência da matéria diminui, de tal sorte que, nos mundos mais avançados, a
vida, por assim dizer, é toda espiritual.
4. Nos mundos intermediários, há mistura
do bem e do mal, predominância de um ou de outro, segundo o grau de
adiantamento. Embora não possa ser feita, dos diversos mundos, uma
classificação absoluta, pode-se, todavia, em razão de seu estado e de sua
destinação, e baseando-se nas diferenças mais acentuadas, dividi-los de um
modo geral, como se segue: os mundos primitivos
destinados às primeiras encarnações da alma humana; os mundos de expiação e de provas, onde o mal
domina; os mundos regeneradores onde
as almas que ainda têm o que expiar haurem novas forças, repousando
das fadigas da luta; os mundos felizes, onde o bem se sobrepõe ao mal; os mundos celestes ou divinos, morada
dos Espíritos depurados, onde o bem reina inteiramente. A Terra pertence à categoria dos mundos de expiação e
de provas, e é por isso que o homem nela é alvo de tantas
misérias.
5. Os Espíritos encarnados sobre um
mundo, a ele não estão ligados
indefinidamente, e não cumprem nele todas as fases progressivas que devem
percorrer para atingirem a perfeição. Quando atingiram sobre um mundo
o grau de adiantamento que ele comporta, passam para um mundo mais
avançado, e assim sucessivamente até que tenham atingido o estado de Espíritos
puros. São igualmente estações em cada uma das quais encontram
elementos de progresso, proporcionais ao seu adiantamento. É para eles uma
recompensa passar para um mundo de ordem mais elevada, como é um castigo
prolongarem sua demora em um mundo infeliz, ou serem relegados para um mundo mais infeliz ainda que aquele que
são forçados a deixar, quando são obstinados no mal.
O Evangelho Segundo o Espiritismo –
Instituto de Difusão Espírita, março 2005
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário